O Concílio Vaticano II afirmou na Lumen Gentium 8 que “a Igreja de Cristo
subsiste na Igreja católica”. O recente documento da Congregação para a
Doutrina da Fé explicou de modo claro o significado de tal expressão.
Apresento agora o comentário
da própria Congregação a esta frase e às questões do Documento
referentes a ela:
Como se deve entender que a Igreja de Cristo
subsiste na Igreja católica.
Quando G. Philips escreveu que a expressão “subsistit
in” faria “correr rios de tinta”, provavelmente não previa que a
discussão haveria de continuar por tanto tempo e com tal intensidade, a
ponto de levar a Congregação para a Doutrina da Fé a publicar o presente
documento.
Uma tamanha insistência, aliás fundada em textos
conciliares e do Magistério sucessivo citados, reflete a preocupação de
salvaguardar a unidade e unicidade da Igreja, que viriam a faltar, se se
admitisse que possam existir mais subsistências da Igreja fundada por
Cristo. De fato, como se diz na Declaração Mysterium Ecclesiae, se assim
fosse, chegar-se-ia a imaginar “a Igreja de Cristo como a soma –
diferenciada e, de algum modo, unitária ao mesmo tempo – das Igrejas e
Comunidades eclesiais” ou a “pensar que a Igreja de Cristo hoje já não
existe em parte alguma e que, portanto, deva ser só objeto de procura da
parte de todas as Igrejas e comunidades”. A única Igreja de Cristo já
não existiria como una na história ou existiria apenas de forma ideal,
ou seja in fieri, numa futura convergência ou reunificação das
diversas Igrejas irmãs, desejada e promovida pelo diálogo.
Mais explícita ainda é a Notificação da Congregação
para a Doutrina da Fé sobre os escritos de Leonardo Boff, segundo o
qual, a única Igreja de Cristo “pode também subsistir noutras Igrejas
cristãs”. Invés – observa a Notificação –, “o Concílio adotou a palavra ‘subsistit’,
precisamente para esclarecer que existe uma só ‘subsistência’ da
verdadeira Igreja, ao passo que, fora da sua composição visível, existem
apenas“elementa Ecclesiae” (elementos da Igreja), que – por
serem elementos da própria Igreja – tendem e conduzem para Igreja
católica”.
Porque se empregou a expressão “subsistit in” e
não o verbo “est”.
Foi precisamente esta mudança de terminologia, na
descrição da relação entre a Igreja de Cristo e a Igreja católica, que
deu ocasião às mais diversas ilações, sobretudo no campo ecumênico. Na
realidade, os Padres conciliares simplesmente entenderam reconhecer a
presença, nas Comunidades cristãs não católicas enquanto tais, de
elementos eclesiais próprios da Igreja de Cristo. Daí resulta que a
identificação da Igreja de Cristo com a Igreja católica não se deve
entender come se, fora da Igreja católica, exista um “vazio eclesial”.
Ao mesmo tempo, significa que, se se considera o contexto em que se
situa a expressãosubsistit in, ou seja, a referência à única
Igreja de Cristo “neste mundo constituída e organizada como uma
sociedade… governada pelo sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão
com ele”, a passagem do est ao subsistit in não assume especial
significado teológico de descontinuidade com a doutrina católica
precedente.
Ora, porque a Igreja assim querida por Cristo
continua de fato a existir (subsistit in) na Igreja Católica, a
continuidade de subsistência comporta uma substancial identidade de
essência entre Igreja de Cristo e Igreja católica. O Concílio quis
ensinar que a Igreja de Jesus Cristo, como sujeito concreto neste mundo,
pode ser encontrada na Igreja católica. Isso só se pode realizar uma
vez, pelo que a concepção, segundo a qual o “subsistit” deveria
multiplicar-se, não traduz propriamente o que se entendia dizer. Com a
palavra “subsistit”, o Concílio queria exprimir a singularidade
e a não multiplicabilidade da Igreja de Cristo: a Igreja existe como
único sujeito na realidade histórica.
Portanto, a substituição de “est” com “subsistit
in”, contrariamente a tantas interpretações sem fundamento, não
significa que a Igreja católica abandone a convicção de ser a única
verdadeira Igreja de Cristo, mas simplesmente significa uma sua maior
abertura à particular exigência do ecumenismo de reconhecer o caráter e
dimensão realmente eclesiais das Comunidades cristãs não em plena
comunhão com a Igreja católica, graças aos “plura elementa
sanctificationis et veritatis” (vários elementos de santificação e de
verdade) nelas presentes. Por conseguinte, embora a Igreja seja só uma e
“subsista” num único sujeito histórico, também fora deste sujeito
visível existem verdadeiras realidades eclesiais.
Fonte:www.domhenrique.com
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